Pouso na água: o que todo piloto precisa saber

06 de novembro de 2025 - Por Lucas Axelrud

Atenção pilotos! Um alerta que vem do mar — e de qualquer corpo d’água

No dia 1º de novembro de 2025, uma piloto de parapente foi resgatada pelos bombeiros após pousar no mar entre as praias Martim de Sá e Prainha, em Caraguatatuba (SP). A ocorrência também envolveu um pescador que tentou prestar socorro e precisou ser resgatado. Felizmente, ambos ficaram bem. O caso reforça a importância de compreender com profundidade os riscos associados ao voo sobre ou próximo a corpos d’água, especialmente quando há uma leitura incorreta da condição meteorológica ou do plano de voo. Situações como essa quase sempre podem ser evitadas com planejamento, análise adequada e decisões conscientes ainda no solo.

Corpos d’água como rios, lagoas, açudes e represas também representam grande perigo, principalmente em casos em que o piloto aciona o paraquedas reserva e deriva até uma área alagada. Mesmo voos longe do litoral podem resultar em pousos críticos sobre a água.


Tipos de pouso na água

Pouso com tempo de preparo

Ocorre quando o piloto tem tempo suficiente para se preparar para o pouso na água. Nesse caso, recomenda-se soltar todas as fivelas da selete quando começar a se aproximar da água, mantendo apenas uma perna presa, e escolher um local de pouso onde a vela não seja empurrada contra o piloto.

Pouso sem tempo de preparo

Acontece quando o piloto não tem tempo para se preparar. É o caso de uma descida rápida e inesperada, em que não há oportunidade de aplicar medidas preventivas. As chances de aprisionamento aumentam muito.

Achar que dá tempo de chegar na margem

É quando o piloto acredita que conseguirá evitar a água e não se prepara adequadamente. É uma das situações mais perigosas, pois geralmente o pouso acaba ocorrendo na água com o piloto despreparado mental e fisicamente.


Tipo de água importa

Pouso em água parada (lagoas, represas ou mar aberto)

Mesmo pequenas ondas podem causar enrolamentos imediatos. A direção do pouso em relação ao vento é tema de discussão mesmo entre instrutores experientes. Alguns instrutores recomendam pouso contra o vento (se houver vento) e estolar a vela. Há recomendação também de pousar de vento de cauda caso não haja vento, e não estolar, para permitir que a vela se afaste do piloto. Já a FAI recomenda que nunca se deve pousar contra o vento, pois a vela pode ser empurrada sobre o piloto e permanecer inflada, provocando arrasto ou submersão. A recomendação é pousar com vento de cauda ou, preferencialmente, de través.

Pouso em rio

O ideal é alinhar a trajetória de pouso cruzando o rio de lado, ou seja, do barranco de um lado ao barranco do outro, perpendicular à correnteza. Isso reduz o risco de a vela e as linhas serem levadas em direção ao piloto pela força da água. Escolha trechos com correnteza fraca e evite áreas com obstáculos ou água rápida. Mantenha o controle da vela o máximo possível.

Pouso em praia com ondas

Tente pousar na faixa de areia seca, longe da arrebentação. Se houver ondas, escolha uma zona onde elas quebrem afastadas do ponto de pouso. Pousar na espuma ou sendo puxado de volta pelas ondas é extremamente perigoso e frequentemente fatal.


A selete, o capacete e a faca de corte

Seletes com airbag ou proteção dorsal aumentam o risco de capotamento na água, forçando o piloto a ficar submerso. Mesmo seletes sem airbag podem dificultar a saída, principalmente se as fivelas estiverem sob tensão após o impacto. Por isso, é imprescindível portar uma faca de corte em local de fácil acesso, idealmente presa ao tronco.

Em pousos com paraquedas reserva, o piloto tende a estar em uma posição inclinada, com acesso ainda mais complicado às fivelas. Ter a faca de corte nesses casos pode ser a única forma de escapar.

Pilotos que usam lastro de chumbo, especialmente coletes, devem abri-los antes do toque na água ou, preferencialmente, cortar o colete para que pousem completamente livre. Não há forma segura de nadar com lastro de chumbo preso ao corpo.

Pilotos que usam capacete fechado devem considerar removê-lo antes do toque na água, desde que isso não aumente o risco de impacto com obstáculos. Um capacete pode dificultar a flutuação e atrapalhar na tentativa de se manter com a cabeça fora d’água.


Treinamento e prática

Todo piloto deve treinar o procedimento de saída da selete de olhos fechados. Situações reais na água envolvem confusão, desorientação, possível afogamento parcial e perda momentânea de visão. Isso é ainda mais importante para quem voa com seletes carenadas, onde o acesso às fivelas pode ser limitado.

Se possível, remova também os calçados antes de tocar a água. Botas e tênis molhados dificultam os movimentos e aumentam o risco de afundamento.


Conclusão

Pousos na água representam um dos maiores riscos no voo livre. As decisões tomadas antes e durante o voo são determinantes para evitar esse tipo de situação. Saber analisar a condição, respeitar sempre o cone de segurança, entender o comportamento da selete na água, portar os equipamentos certos e treinar constantemente os procedimentos de escape não é opcional — é essencial.

As informações apresentadas aqui estão baseadas em recomendações da Federação Aeronáutica Internacional (FAI) e de instrutores experientes. Elas existem para proteger vidas. Que cada voo seja também um compromisso com a sua própria segurança.

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